“A maneira de a pessoa rever a sua vida não é aprisionando o corpo, enquanto nós tivermos essa idéia de que aprisionando a pessoa e cercear seu direito de ir e vir, nós não estamos mudando os valores da alma. É preciso que o Estado e a sociedade revejam os seus valores”.
Em entrevista a pesquisadora Regina Célia de Souza Beretta, apresentou sua tese de doutorado, denominada “Um dos desafios da Questão Social: Adolescentes em cumprimento das Medidas Sócio-Educativas em Araraquara – SP”. A pesquisa foi realizada sob a orientação de Maria Ângela R. A. de Andrade, pelo programa de pós-graduação da Universidade Júlio de Mesquita do Estado de São Paulo/ Unesp – Franca. Beretta é ainda funcionária da prefeitura, prestes a completar vinte e cinco anos de carreira enquanto funcionária pública.
Sobre a pesquisa ela afirma “foram entrevistadas no total 21 pessoas para a composição da pesquisa onde obtive uma amostra de cada parte do sistema, o objetivo da pesquisa é entender a eficiência e a eficácia das medidas sócio-educativas, previstas no ECA”. “De 2006 a 2008 foi o recorte temporal das entrevistas, sempre dando destaque às questões dos direitos humanos”, acrescenta a pesquisadora.
Sobre os desdobramentos de seu trabalho, Beretta diz “minha tese foi classificada para o Congresso Internacional de direitos humanos, que vai acontecer agora no Uruguai, onde irei proferir palestra sobre meu tema de pesquisa”.
Sobre sua opção por estudar um tema que aborde adolescentes em conflito com a lei, diz “pois começou a me incomodar um pouco o processo de municipalização da aplicação das medidas sócio-educativas. È importante ressaltar que Araraquara é um dos poucos municípios do Brasil, que tem todas as medidas sócio-educativas previstas no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), em funcionamento”.
Em Araraquara, eu pesquisei os boletins de ocorrências no ano de 2007, 36% dos delitos cometidos pelos jovens ocorrem dentro da escola e 25% dentro das casas. Quando questionada sobre as internações no Brasil, diz “é só adolescente pobre que comete ato infracional, não. Mas, é só adolescente pobre que cumpre medida”. A pesquisadora afirma ainda, que 70% dos adolescentes relacionados às medidas sócio-educativas no Brasil são negros.
Sobre o funcionamento das medias sócio-educativas explica “as medidas são aplicadas pelo juiz conforme a natureza, as circunstâncias, o ato infracional e a realidade do adolescente. Estas quatro categorias que decidem quais serão as medidas que ele vai tomar”. Explica ainda sobre o assunto, “as medidas previstas são a advertência verbal, reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, a semiliberdade e a última a internação”.
A advertência verbal e a reparação do dano estão sob responsabilidade autônoma do poder judiciário, quanto à decisão de encaminhamento do adolescente. A prestação de serviço à comunidade e a liberdade assistida estão sob responsabilidade do município e a internação e semiliberdade são do Estado. “O regime aberto é de responsabilidade do município e o regime fechado é de responsabilidade do Estado”, complementa Beretta.
A pesquisadora afirma que existem ainda muitos problemas relacionados à forma como a sociedade pensa a relação entre violência e juventude “a culpabilização e a criminalização ainda esta no jovem”.
A pesquisadora explica ainda, que no Brasil em geral, jovens que cometem atos infracionais, acabam internados por falta de haverem disponíveis nos municípios outras medidas sócio-educativas. Explica, Beretta “por muitas cidades não contarem com os programas das medidas sócio-educativas, o que irá acontecer é que o juiz não terá opção, ele vai usar o recurso que ele tem”.A lógica da internação, é intensiva, apesar de só poder ser aplicada quando o adolescente coloca em risco sua vida ou a vida do outro, isto é um dado fundamental.
Comenta ainda que pode citar três mitos que devem ser superados para analisar a relação entre juventude e violência “o primeiro é o sentimento de impunidade frente aos jovens infratores, hiperdimensionamento do problema e periculosidade dos adolescentes”.
“A reincidência em Araraquara dos adolescentes é de apenas 6 % da liberdade assistida e 3% da prestação de serviço à comunidade. Este é um indicador muito pequeno de reincidência. Se você olhar no site do governo federal, temos entre 12 e 13 mil adolescentes internados onde os principais delitos cometidos por eles são danos ao patrimônio e trafico de drogas, eles respondem por menos de 10 por cento dos crimes do Brasil “.
Renata afirma que atualmente São Paulo congrega o maior número de municípios com a municipalização das medidas. “Sabe quantos municípios existem com medidas que abrangem o sistema de regime aberto em Minas Gerais? 50 municípios apenas, sendo que depois de São Paulo, Minas Gerais é o estado mais avançado, afirma a pesquisadora”.
Publicado no Jornal Folha da Cidade – Araraquara/SP
Luís Michel Françoso
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